Nos
dias 02 e 03 de agosto de 2018 ocorreu no campus de Bom Jesus, da Universidade
Federal do Piauí, o 1º Seminário e 1º Ciclo de Oficinas Culturais da
Licenciatura em Educação do Campo (Ledoc)/CPCE: arte, direito e educação na
construção da resistência camponesa. O evento teve como objetivo promover
reflexões, intercâmbios e práticas acerca da arte, do direito e da educação na
construção da resistência camponesa, rumo à emancipação social dos sujeitos do
campo.
A
Educação do Campo da UnB esteve representada pela coordenadora do curso de
Licenciatura em Educação do Campo, professora Eliene Novaes Rocha, também
integrante do Fórum Nacional da Educação do Campo (Fonec), pela professora
egressa da Ledoc Adriana Gomes, mestranda da Faculdade de Educação da UnB e
pelo professor Rafael Litvin Villas Bôas, da Ledoc e coordenador de extensão da
Faculdade UnB Planaltina.
Na manhã do primeiro dia foram
apresentados os resultados da pesquisa coordenada pelos professores Ozaías
Batista e Socorro Pereira da Silva, sobre o "Perfil socioeducacional dos
discentes da Educação do Campo". A riqueza e minúcia dos dados coletados e
sistematizados permitiu um diagnóstico do público discente da Ledoc/Bom Jesus,
abordando questões como renda média das famílias, principais dificuldades para
a permanência e conclusão do curso, relação com os movimentos sociais, etc. O
questionamento sobre os dados oportunizou o debate sobre a metodologia
da pesquisa, a partir do indagações sobre os critérios e focos do
levantamento, aplicada à realidade dos próprios estudantes.
A mesa sobre “Arte, direito,
educação e política na construção da resistência camponesa: do planalto central
à região do PDA Matopiba”, realizada a tarde, contou com a presença dos dois
professores da UnB e do juiz Eliomar Rios da Vara Agrária de Bom Jesus-PI. Caso
raro no meio judiciário brasileiro atual, o juiz demonstrou conhecer in
locoas comunidades rurais do sul do Piauí, muitas vezes envolvidas em
conflitos fundiários para resistir aos interesses do grande capital, que
investe na estrangeirização de terras e produção em larga escala para
exportação. A fala do juiz deixou claro que os empreendimentos do
agronegócio produzem efeitos danosos ao meio ambiente e aterradores à população
local, a partir de expedientes como grilagem e grilagem digital da terra,
associados à exploração do trabalho em fazendas pecuaristas e sojeiras, à
privatização da água do subsolo para irrigação e ao uso livre de agrotóxicos e
demais componentes do pacote tecnológico da agricultura capitalista.
A mesa destacou-se ainda por
abordar o entrelaçamento entre soberania territorial, soberania alimentar e
soberania cultural, articuladas à soberania nacional, enquanto demanda de
construção de um projeto de nação.
Tais articulações foram
aprofundadas no segundo dia de evento, por meio da exposição do Sr. Carlos
Humberto Campos (Cáritas Brasileira), cuja exposição foi antecedida por dois
juris simulados, encenados por estudantes da Ledoc: um que abordou o tema das
desigualdades de gênero no campo e outro que abordou a contradição entre os
projetos de desenvolvimento do campo (capital x trabalho) evidentes,
entre as chapadas e baixões, na região do Vale do Gurguéia (sul do PI). O
debate contou com forte participação de estudantes e professores da UFPI e de
representantes dos movimentos sociais e sindicais presentes (CPT, MST, Fetag,
Cáritas, Movimento Quilombola, etc).
O esforço de articular os temas
do Direito, da Cultura e da Educação esteve presente também nas apresentações
culturais do Coletivo Cenas Camponesas, estreando a peça
"Luta Nossa, camponesa" (projeto de extensão da Ledoc/UFPI), do grupo
de teatro “Improvisa
Cantídio, da escola municipal de Cantídio/Comunidade Rural de Corrente dos
Matões (Bom Jesus/PI), e do grupo de Maculelê da Comunidade Quilombola Brejão
dos Aipins (Redenção/PI).
Os
dois grupos de teatro que se apresentaram, um de adolescentes de uma escola e
outro de estudantes da Ledoc, abordaram dinâmicas do conflito fundiário no sul
o PI: o tema da grilagem digital de terras e as consequências para a população
camponesa, no caso do primeiro grupo, e as ameaças de jagunços que uma família
de agricultores sofre para vender suas terras para um fazendeiro, no caso do
segundo grupo. Nos dois casos o teatro tratou da questão agrária brasileira e
dos conflitos fundiários a ela subjacentes, buscando dar forma estética aos
problemas políticos e econômicos vivenciados pelas comunidades que vivem na
fronteira agrícola de expansão do agronegócio, conhecida como Projeto de
Desenvolvimento Agrária (PDA) Matopiba, por estar em área de fronteirados estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia.
Por
diferentes e criativos métodos, o seminário tratou de socializar conhecimentos
em diferentes áreas, de maneira articulada, e envolvendo diferentes setores da
sociedade e do Estado. Cabe destacar os concursos realizados na noite cultural,
de forró, de melhor cachaça artesanal da região, de melhor doce caseiro e de
melhor farinha de mandioca. Para cada atividade os concorrentes tinham que
explicar a origem e o modo de produção dos produtos e os jurados tinham que
elucidar ao público a razão de suas escolhas, tendo em vista os critérios
previamente adotados. Além de divertida, a proposta se mostrou eficaz instrumento
de propaganda da produção culinária da agricultura camponesa, dando voz aos
produtores e produtoras locais.
Por
fim, cabe salientar que o encontro proporcionou o intercâmbio entre as
experiências de extensão doscampus de Planaltina da UnB e de Bom Jesus da UFPI
e desenhou possibilidades de fortalecimento do intercâmbio entre as ações das
duas licenciaturas e dos dois campi, os quais possuem características
semelhantes. O próximo encontro da agenda é a vinda do grupo Cenas Camponesas
para se apresentar na III Mostra Terra em Cena e na Tela, organizada pelo
Coletivo e programa de extensão Terra em Cena, a ser realizada nos dias 24 e 25
de setembro de 2018, durante a Semana Universitária da UnB.
Eliene Novaes, Rafael Villas Bôas (professores da
Ledoc/UnB), Kelci Pereira (professora da Ledoc/UFPI-Bom Jesus) e Adriana Gomes
(Mestranda da FE/UnB)
Texto publicado originalmente no blog
terraemcena.blogspot.com
5/9/2018
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